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"Jornal BIOQUIMICAp: ENTREVISTA COM O PROFESSOR MOZART NEVES RAMOS"

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28 de junho de 2013

ENTREVISTA COM O PROFESSOR MOZART NEVES RAMOS

Por Pedro Gomes

Perguntas:

P. Dentre todas as ciências que hoje existem, porque a química? Porque o senhor escolheu-a para sua carreira de vida?
R. No Ensino Médio me encantei, na verdade, foi com a Física. Não tinha tanta admiração pela Química. Por outro lado, sabia que queria fazer Engenharia, e escolhi a Engenharia Química na UFPE, mas não tinha tanta certeza de qual Engenharia. Assim, iniciei também Engenharia Civil na Universidade Católica. Comecei a gostar mesmo de Química foi quando comecei a estudar as disciplinas de Físico-Química no curso de Engenharia Química. Nesse momento, descobri o que queria fazer ao longo da vida. Daí se seguiu o Doutorado na UNICAMP e o Pós-Doutorado no Politécnico de Milão, sempre em Físico-Química dirigida ao estudo de estrutura de moléculas.

P. O que há de especial nessa forma de ver a realidade(de ver as coisas pelo ponto de vista da química)?
R. Sempre achei fascinante o fato de a forma das moléculas, se linear, planar ou não, angular...está associada às suas propriedades e reatividade. Conhecer a estrutura das moléculas me encanta até hoje. O exemplo mais marcante é a estrutura do benzeno. Gostaria de ter feito essa descoberta e assim, invejo Kekulé.

P. A respeito da química teórica, até que ponto vai sua utilidade e como ela se expressa?
R. A química teórica me fascinou quando ingressei no doutorado na UNICAMP. Ela nos permite determinar a estrutura e as propriedades de moléculas. E assim, tem várias aplicações, especialmente de forma conjugada com a química experimental. Com ela estudei a relação entre estrutura e atividade biológica das moléculas, permitindo assim prever fármacos mais potentes e menos tóxicos. Ela me propiciou o estudo de moléculas no espaço interestelar, que levou a descoberta, por exemplo, dos carbenos na região de Taurus. Outra bela aplicação, ao longo de minha vida, foi o estudo de complexos de hidrogênio. Existem muitas outras aplicações interessantes e encantadoras.

P. Quais foram os trabalhos e pesquisas que mais achou interessante, que mais lhe intrigaram e o mobilizaram?
R. Acho que respondi na pergunta anterior, mas a descoberta da molécula C3NH na região de Taurus me deixou muito realizado.

P.Como é a vida de um pesquisador? Há algum projeto ou sonho que quisera fazer e não fez ou quer fazer e não pode?
R. Ser um pesquisador requer disciplina, determinação e muito estudo – sempre. No início de meus cálculos computacionais, que exigiam muito espaço de memória e tempo computacional “dormia” (noites e noites acordadas) na universidade, pois a noite o computador estava mais livre. Finais de semana no laboratório, muito sacrifício, mas fazia com muita alegria, pois fazia com prazer o meu trabalho. E quando saia os resultados publicados numa revista de prestígio internacional era o momento do “grande gol”, de que havia sido válido todo o sacrifício. 
Acho que fiz tudo aquilo que planejei até aqui, estou sempre me sentido realizado, mas inquieto, graças a Deus!


P. Como surgiu o interesse na educação?
R. O tempo corria de forma muito intensa na minha vida profissional. E muito jovem, aos 34 anos, fui convidado para ser pró-reitor acadêmico da UFPE. O trabalho foi reconhecido pela comunidade e fui eleito o reitor mais jovem do Brasil. Fui o primeiro reitor reeleito da UFPE. Oito anos de muito trabalho, de dedicação intensa a UFPE. O trabalho chamou a atenção da sociedade e fui levado ao cargo de Secretário de Educação do Estado de Pernambuco. E aí começou a minha segunda, hoje primeira, paixão: a Educação! E hoje me dedico exclusivamente às políticas públicas da Educação, deixei a Química, mas meus ex-alunos, de maneira brilhante, continuam o legado deixado nesse campo.

P. Do que a educação realmente trata? Quais são suas esferas de influência no humano?
R. A Educação que é capaz de promover o ser humano em toda a sua plenitude: ética, moral, social e cultural. A Educação é o único vetor capaz de alinhar desenvolvimento econômico com o social. Esse é ainda o grande desafio brasileiro; nosso país é a 7ª potência mundial em termos de toda a riqueza produzida, medida pelo Produto Interno Bruto (PIB), mas encontra-se, por outro lado, na 84ª posição no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Trabalhar em prol de uma Educação de qualidade para todos os brasileiros me instiga e me motiva profundamente. Tornar a carreira do magistério objeto de desejo da nossa juventude é o maior desafio!

P. Qual é sua real importância?
R. Acho que falei, em parte, na questão acima. Mas acrescentaria que a sustentabilidade de um país passa necessariamente pela Educação, pois constrói um ambiente de cultura de paz, de equidade social, de valores éticos e morais, de igualdade de gênero, de melhor distribuição de renda, ou seja, leva ao desenvolvimento sustentável.

P. No Brasil, o senhor e a Milú Vilella se pronunciaram numa matéria do jornal do comércio de são paulo, e mostraram que a educação só pode aqui melhorar se houver incentivos à carreira do professor(a valorização no geral). Somente desta maneira o Brasil pode deslanchar e crescer enquanto economia. O que podem fazer os brasileiros (no geral) para consumar esse fato?
R. É preciso que a população eleja a Educação como a sua maior prioridade, seu bem maior, por tudo que falamos aqui. Mas, grande parte dos governantes só a priorizam no momento das eleições, e depois esquecem do que prometeram. O que era antes investimento passa a ser despesa, essa lógica precisa ser alterada. Felizmente, a população está cada vez mais escolarizada. Os pais antes cobravam vaga nas escolas para seus filhos. Hoje, eles sabem que isso é um direito que lhes cabem. Eles começam agora a cobrar aprendizagem, e isso vai mudar o país.
Para tornar atraente e valorizada a carreira do magistério é preciso investir mais em educação e gerir melhor esses recursos, de forma que os mesmos cheguem às escolas, investindo no salário e no plano de carreira do professor, pautado em formação continuada e melhor desempenho em sala de aula.

P. Qual é sua(s) previsão(ões) para o estado da educação nos próximos 5, 10 e 20 anos?
R. Eu só otimista. O Brasil vai dar um salto educacional, está no caminho certo, mas precisa acelerar. O maior desafio é a escola do jovem – o ensino médio está estagnado há mais de 10 anos, mas podemos mudar isso com a participação e envolvimento da sociedade, dos pais e das instituições. Para isso, precisamos sair do atual trinômio: escola do século 19, professor do século 20 e aluno do século 21. É preciso colocar todo mundo no século 21. As novas tecnologias estão aí para ajudar, mas vai precisar de bons professores. O professor deveria ser o grande protagonista deste século – do conhecimento e da inovação. São tempos da chamada Economia Criativa.


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